segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Criança geopolítica observando o nascimento do homem novo - Salvador Dalí

A CRÍTICA E A PRÁTICA

Caro amigo, vi teu belo discurso em defesa dos pobres e fiquei pensando o que significa o pensamento crítico nos dias de hoje? De que maneira essa noção, que outrora identificávamos facilmente com nomes como o de Sartre, dos membros da Escola de Frankfurt, de Frantz Fanon ou também com certos pensadores comprometidos da América Latina; transformou-se (alguns dizem que desapareceu) juntamente com as profundas alterações que o mundo vem sofrendo. Uma transformação que se utilizou de discursos que outrora foram utópicos e de ideais libertadores para hoje colonizar a totalidade do mundo, da vida até seus recônditos mais íntimos, sob a lógica matricial de fetichismo da mercadoria, a verdadeira metafísica do capital. Capital que em comparsa com a mídia e o “Deus Sony” na sala de tua casa, faz com que o novo crítico fale como um libertário, mas não abre mão do acúmulo do vil metal e de certa forma do poder. Como disse Foucault sobre o poder: “e de que outras coisas estão falando, senão de poder?”
Você faz o que prega? Você é tão libertário quanto discursa? Caro amigo, a irracionalidade instrumental do capital, “não apenas cria objetos, mas sim sujeitos para esse objeto” (Horkheimer e Adorno).  Então você tem a luta e o belo discurso em mente; mas, sem sentir que é comandado, vive um quadro social que a sua profissão e sua “posição” exige e esquece a luta. Você pode falar e querer mostrar que sair do capitalismo é o suficiente para conseguir escapar da “jaula de ferro” do capital, isto é um engano. A modernidade, essa lógica cultural do capitalismo, gira sobre a redução do político a política, do crítico a crítica e o sociometabolismo do capital engoliu você e sua própria máquina de pensar. Às vezes você com conhecimento pode até ser um bom crítico, mas cá pra nós, seu discurso é falso, é político, é só para impressionar os miseráveis, amigos de páginas sociais e seus amigos de banquetes. Nesses momentos o capital ainda não continua falando mais alto?
Ainda mais para os jovens mais ambiciosos vindos da tua mesma genealogia. Estes jovens chamam a si mesmo de revolucionário, e até libertário. Porém, nunca leram ou desde os tempos da faculdade não colocaram mais os olhos num livro de Marx, de Hobsbawn, de Gramsci ou Brecht, e nunca ouviram falar de Bauman ou Zizek. Este é o famoso “Marxismo sem proletariado”, que está ocupado demais em acumular riqueza, sobreviver maravilhosamente bem e manter seu status quo. Seu intervencionismo urbano, suas esmolas, suas fotografias fazendo caridade, publicações mostrando uma “moral”. Seu discurso comove seus pares, e mesmo não sendo resplandecente vai formando uma base moral hipócrita da apologia da caridade. Esta é a vil e humilhadora esmola que chega até as colunas sociais.
Bem, tudo isso é para dizer para você que seu discurso filantrópico não combina com você e muito menos com o salário que você paga aos seus funcionários. Às vezes, como amigo, penso que você é bem-vindamente radical, quase me impressiona, é até simpático falando. Mas, é impotente para nos representar e amorfamente inarticulável dentro do processo político do oprimido, um embuste apenas para comover sua confraria que tem os mesmos discursos e atitudes.

Sds. Jaime Baghá - Observando o amigo burguês e sua pantomima altruísta.

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