quinta-feira, 26 de março de 2009


ESCÓRIA

Uma cria parda, têz insalubre
Pai, um pária, amante dos destilados
Mãe, vida fácil, amante dos desvairados
Vida bastarda, trejeitos rudes

Vai conhecer outro sujo, bastardo
Tal qual o pai, confraria dos pulhas
Assim como a mãe, madame amargura
Para o moto-contínuo dos desgraçados

Acostuma-te a vida miserável
Ao desdém dos bem nascidos intragáveis
Pega os restos que te são oferecidos

Revolta-te contra o estado que te marca
Saqueia e mata o carrasco de tua via sacra
Ou ora a teu deus na procissão dos esquecidos

*Imagens: Paulo Freire, Bertold Brecht, P. J. Proudhon, Eduardo Galeano


A TEMPESTADE *

Eis o progresso
A abjeção dos afortunados
Dos vampiros abastados
E o resto?

Eis o resto, indecisos
Aumentando o lixo
Vivendo feito bixos
Marginais dos ventos do paraíso

Eis os malditos
De vida chifrin
Amontoando detritos

Eis a escória
Do Querubim de Benjamin
O anjo da história.

Olhando o lixo, como Walter Benjamin e sua visão do quadro de Paul Klee "Angelus Novus".
"Aquilo a que chamamos de progresso é este vendaval".

*Imagens: Walter Benjamin e o quadro de Paul Klee "Angelus Novus"

A NOSTALGIA DA LAMA *

Frequentei o Bar dos perdidos
Em conversas de subterrâneos
Acatando a razão dos enganos
Entre bêbados, drogados e esquecidos

Visitei a escória das bacantes pobres
Em meio a caterva dos indecentes
Laudanos, bebidas, amor ardente
Nunca achei companhias tão nobres

Amei o tugúrio dos edonistas
O doce prazer que engana
Os decadentes artistas

Sou o poeta devasso
A nostalgia da lama
O social em descompasso.

Como sempre amei os subterrâneos.

Minha homenagem a "Nostalgie de La Boue" de Baudelaire.